Fragmentos da história…

Em 1846, na cidade do Rio Grande, Estado do Rio Grande do Sul, fundou-se importante estabelecimento cultural, cuja finalidade consistia em contribuir para a difusão, em meio à população, do gosto pela leitura e da busca pelos estudos: o Gabinete de Leitura. Anos mais tarde, essa mesma instituição passaria a denominar-se Biblioteca Rio-Grandense.

Surgido no contexto da pacificação da Revolução Farroupilha (1835-1845), o Gabinete de Leitura veio para contribuir com a educação do povo, já que nesse período praticamente não existiam instituições destinadas à instrução da população. Teve como seus idealizadores 22 homens da sociedade, sendo o principal incentivador o comerciante português João Barbosa Coelho.

Nessa época, Porto Alegre já sediava o principal núcleo administrativo e político do Estado, e a cidade do Rio Grande, por sua vez, podia ser considerada o mais importante centro econômico do Rio Grande do Sul – era daqui que entravam e saíam produtos comercializados no Estado e onde, também, atuavam os consulados gerais dos principais países europeus e americanos. Tais fatores, aliados ao espírito cívico e ao patriotismo fortemente presentes na época devido aos acontecimentos pós-Revolução, culminaram no estabelecimento de uma instituição cujo principal objetivo visava à difusão da cultura.

As Figuras 1, 2 e 3 apresentam pequenos fragmentos da história dessa relevante e pioneira instituição gaúcha: as marcas utilizadas, ao longo do tempo, para atestar a sua propriedade sobre os livros que compõem o acervo.

A Figura 1 apresenta um carimbo molhado de formato retangular, na cor azul, onde se lê a inscrição “GABINETE DE LEITURA NO RIO GRANDE” emoldurada com filete simples.

A Figura 2 apresenta a imagem da folha de guarda de um livro contendo dois carimbos. O primeiro carimbo, de cor preta, formato retangular e moldura com filete duplo, carrega a marca de propriedade da instituição, por meio da inscrição BIBLIOTHECA RIO-GRANDENSE (ao alto), complementada por informações de identificação da obra e de procedência, com as seguintes inscrições: “Nº da obra: (linha preenchida com “36.059” a lápis), Volumes: (linha em branco), Estante: (linha preenchida com “A0” a lápis), Prateleira: (linha preenchida com “5” a lápis), Oferta de: (linha preenchida com “O.44.322” a lápis).

Ainda na Figura 2, logo abaixo do carimbo de identificação da instituição, observa-se um segundo carimbo, de formato retangular, moldura com filete duplo, contendo a inscrição NÃO SAE, o que sinaliza a forma de circulação da obra em questão, na instituição, indicando que a mesma não está disponível para empréstimo domiciliar. Na mesma imagem, ao alto e à direita da página, observa-se anotação manuscrita a lápis.

A Figura 3 apresenta uma etiqueta de propriedade, com arranjo semelhante ao carimbo de propriedade apresentado na Figura 2, porém com variações nas informações complementares. A etiqueta, colada sobre a guarda marmorizada do livro, apresenta formato retangular, moldura decorada e as seguintes inscrições: Bibliotheca Rio-Grandense (ao alto), N. da Obra (linha tracejada preenchida com “6363” a tinta), Volumes (linha tracejada preenchida com “1” a tinta), Armario (linha tracejada preenchida com “11” a tinta e riscado, com anotação “7” a lápis, ao lado), Estante (linha tracejada preenchida com “3” a tinta e riscado, com anotações “5” a tinta e “5” a lápis, ao lado), Prateleira (linha tracejada preenchida com “5” a tinta e riscado, com anotação “6” a tinta, ao lado; abaixo a anotação “O.42987” a lápis).

Ainda na Figura 3, ao alto, observa-se uma etiqueta de livreiro, sinalizando que o livro foi comercializado por “Daniel de Barros e Silva”, em Rio Grande, RS.

Em síntese, as marcas de proveniência fornecem informações sobre o status dos documentos que compõem uma coleção, como informações sobre o modo de aquisição, pessoas e/ou entidades envolvidas neste processo (JOSSERAND, 2016). “Além do conhecimento sobre a origem e a formação das coleções, as informações de proveniência contribuem para o conhecimento da história das próprias bibliotecas, podendo tais informações ser utilizadas como recurso estratégico para a promoção das instituições ao público e para a obtenção de recursos visando à salvaguarda dos acervos.” (RODRIGUES et al., 2022, p. 187).

Conhecer as marcas de propriedade utilizadas por uma instituição, além de contribuir para o conhecimento da história dela própria e de suas rotinas ao longo do tempo, proporciona maior segurança ao acervo, colaborando na identificação e no resgate de itens desaparecidos por extravio, roubo ou furto.


Referências:

JOSSERAND, Claire. Les données de provenance des collections des bibliothéquesMémoire d’étude, janvier 2016. 

RODRIGUES, Marcia Carvalho et al. Proveniência e Biblioteconomia: relato da pesquisa realizada para a elaboração do Glossário Ilustrado de Marcas de Proveniência. In: FREITAS. Thiago Cirne (Org.). Grupo de Discussão em Coleções Especiais Jurídicas: debates para o futuro do patrimônio bibliográfico no Direito. Rio de Janeiro: GIDJ/RJ, 2022.